o complexo industrial-militar e a economia de guerra nasceram e se estruturaram nas grandes potências capitalistas e demonstrar a necessidade imperiosa de que ambos sejam levados ao fim no mundo para que a paz mundial possa existir. Na atualidade, o progresso de uma nação ou de uma região é medido pelo tamanho e pelo crescimento do PIB (Produto Interno Bruto). No cálculo do PIB, são efetuadas medidas da produção na indústria, na agropecuária, no setor de serviços, do consumo das famílias, do gasto do governo, do investimento das empresas e da balança comercial. A fórmula para o cálculo do PIB é a seguinte:
PIB = consumo privado (C) + investimentos totais realizados (I) + gastos do governo (G) + exportações (X) – importações (M)
Uma economia entra em recessão quando há uma queda no consumo privado (C) e nos investimentos totais realizados (I). Foi Keynes quem sugeriu que, em épocas de recessão e depressão, os gastos do governo (G) deveriam aumentar para compensar a queda no consumo e nos investimentos na economia para manter o pleno emprego. A economia de guerra surgiu na Alemanha nazista e nos Estados Unidos na década de 1930 do século XX como um conjunto de práticas econômicas aplicadas com o objetivo de estabilizar a economia de um país durante um período de guerra com a expansão dos gastos públicos. Isto acontece quando o funcionamento do sistema capitalista entra em colapso como ocorreu na Alemanha e nos Estados Unidos na década de 1930. A partir do século XX, em um ambiente depressivo, não podendo investir seus lucros na reprodução de bens de capitais ou de bens de consumo, o sistema capitalista, representado por sua classe dominante, buscou investir em uma nova área, a de produção de armamentos, porque a guerra contribui para aumentar a venda de armas, promover o incremento da indústria, do comércio e dos serviços e mobilizar a construção civil com o esforço de reconstrução no pós guerra, como Plano Marshall após a 2ª Guerra Mundial, além de eliminar os excedentes populacionais com o assassinato em massa de soldados e populações civis como ocorreu na 1ª e 2ª Guerra Mundial (80 milhões de mortos).
Uma economia de guerra opera como um sistema de produção, mobilizando e alocando recursos para sustentar a violência. Muitos estados nacionais, sobretudo as grandes potências, aumentam o grau de planejamento em suas economias durante as guerras. Do lado da demanda agregada, o conceito de economia de guerra tem sido associado ao conceito de “keynesianismo militar”, no qual o orçamento militar do governo estabiliza ciclos e flutuações de negócios e/ou é usado para combater recessões e depressões como fez Hiltler na Alemanha nazista após a 1ª Guerra Mundial quando a economia alemã se reergueu da depressão ocorrida na década de 1920 e Franklin Delano Roosevelt nos Estados Unidos ocorrida na década de 1930 quando a economia norte-americana se reergueu da depressão resultante da crise da Bolsa de Nova York em 1929. Do lado da oferta, constata-se que a guerra contribui para acelerar o progresso tecnológico a tal ponto que uma economia é fortemente fortalecida após a guerra, especialmente se não tiver sofrido a destruição relacionada à guerra. Este foi o caso dos Estados Unidos que não sofreu internamente a destruição em consequência da 2ª Guerra Mundial e não foi o caso da Alemanha onde grande parte do país foi destruida durante a 2ª Guerra Mundial.
Durante a 2ª Guerra Mundial, os nazistas introduziram novas políticas que não apenas causaram a queda da taxa de desemprego na Alemanha, mas também criaram uma máquina de guerra competente. O Terceiro Reich implementou um projeto e construiu fábricas para suprir suas forças armadas em rápida expansão. Ambas as ações, a máquina de guerra e a construção da indústria bélica, criaram empregos para muitos alemães que lutavam contra o colapso econômico após a 1ª Guerra Mundial. Além disso, a Alemanha explorou as economias dos países que invadiu. A mais importante delas foi, sem dúvida, a França e sua economia altamente desenvolvida, uma das maiores da Europa. A economia francesa supriu 11% da renda nacional da Alemanha (durante a ocupação alemã da França), que cobriu cinco meses da renda total da Alemanha para a guerra. Usando extorsão e trabalho forçado, os nazistas desviaram em seu benefício grande parte da produção econômica da França. Durante os primeiros meses da ocupação nazista, o governo fantoche francês do general Pétain foi forçado a pagar uma taxa de "aquartelamento" de vinte milhões de marcos à Alemanha por dia. Supostamente, a taxa era o pagamento das forças de ocupação nazistas. Este dinheiro foi usado para abastecer a economia de guerra nazista.
Os Estados Unidos têm uma história muito complexa com a economia de guerra. Muitos exemplos notáveis ocorreram durante o século XX, em que os principais conflitos dos Estados Unidos consistiram nas duas Guerras Mundiais, na Guerra da Coréia e na Guerra do Vietnã. Ao se mobilizar para a 1ª Guerra Mundial, os Estados Unidos expandiram seus poderes governamentais criando instituições como o War Industries Board (WIB) para ajudar na produção militar. Durante a 2ª Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos tomou medidas semelhantes ao conceder contratos de defesa, alocando recursos escassos - como borracha, cobre e petróleo - para usos militares e persuadiu empresas a se converterem em produção militar. Dois terços da economia americana foram integrados ao esforço de guerra no final de 1943. Devido a essa cooperação maciça entre o governo e as entidades privadas, pode-se argumentar que as medidas econômicas adotadas antes e durante a Segunda Guerra Mundial ajudaram a formar o complexo industrial-militar. Os Estados Unidos estiveram envolvidos em numerosos empreendimentos militares no Oriente Médio e na América Latina desde a década de 1960. Os Estados Unidos estão em estado de guerra contínuo desde os ataques de 11 de setembro, cujo orçamento militar anual é maior do que os orçamentos militares combinados da Índia, China, Rússia, Reino Unido, Alemanha, Arábia Saudita e França.
A construção e expansão do complexo industrial-militar norte-americano durante a 2ª Guerra Mundial se constituiu em poderoso instrumento a serviço do poder global dos Estados Unidos. As guerras e seus senhores tornaram-se assunto permanente em matéria de política doméstica e de inserção internacional dos Estados Unidos. O lobby da indústria bélica é considerado um dos mais poderosos do país. Ele reúne membros do Congresso ligados a distritos dependentes dessa indústria, o Departamento de Defesa e os braços a ele relacionados, e empresas de grande porte, como Boeing, Lockheed Martin e Northrop Grumman, por exemplo. Desde a 2ª Guerra Mundial, os gastos militares se multiplicaram nos Estados Unidos e, impulsionados pela Guerra Fria e depois pelo 11 de setembro, nunca deixaram de crescer. A guerra tem sido utilizada pelo governo dos Estados Unidos como um esforço permanente para evitar a deterioração das condições econômicas ou crises monetárias do país, com o governo promovendo a expansão de serviços e empregos nas forças armadas e a expansão da indústria bélica que é a maior do mundo.
Os relatórios publicados anualmente pelo SIPRI, o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo, evidenciam que os Estados Unidos se mantém como o maior responsável pelos gastos militares no mundo. No documento de 2021, ainda antes do início da Guerra na Ucrânia, os norte-americanos apareciam como os que empregaram US$ 778 bilhões nesse setor. Em segundo lugar, com diferença digna de nota, vinha a China (US$ 252 bilhões), seguida da Índia (US$ 72,9 bilhões) e somente então a Rússia (US$ 61,7 bilhões). O papel do complexo industrial-militar norte-americano ganhou relevância recentemente quando o presidente Joe Biden visitou uma instalação da Lockheed Martin no Alabama. Trata-se da maior produtora de armas do mundo e de uma das mais importantes fornecedoras do governo dos Estados Unidos. Os contratos, nos últimos anos, passaram da casa dos bilhões de dólares. Além disso, a Lockheed Martin também costuma ser mencionada no contexto de discussões envolvendo o papel da OTAN no mundo, uma vez que é uma das organizações que mais incentiva sua expansão.
A visita de Biden à Lockheed Martin reforçou seu pedido ao Congresso dos Estados Unidos para que acelerasse a aprovação de um novo pacote de ajuda militar à Ucrânia. Vale lembrar que, pouco tempo antes, também a Alemanha, que está em vias de rever sua posição sobre desarmamento, anunciou a compra de jatos F-35 da Lockheed, o que causou um pico no preço das ações da empresa, alcançando um aumento de 43,4% em apenas quatro meses. Desde o início do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, os norte-americanos já enviaram bilhões de dólares em armas para o governo ucraniano, e o orçamento do Pentágono não deixa de crescer. Combater um "inimigo externo comum", com cara de Guerra Fria, conquistou apoio bipartidário nos Estados Unidos.
Como fazer para celebrar a paz na guerra entre a Rússia e a Ucrânia? A guerra entre Rússia e Ucrânia só chegará ao fim desde que sejam eliminadas suas causas. São duas as causas da guerra: 1) a expansão da OTAN, aliança militar ocidental, rumo às fronteiras da Rússia; e, 2) o desejo do governo da Ucrânia de se incorporar à OTAN. Estas foram as duas razões que contribuíram para a invasão da Ucrânia pela Rússia para eliminar a ameaça da Ucrânia se incorporar à OTAN. As tentativas de celebração da paz entre os governos da Rússia e da Ucrânia foram infrutíferas e o que se observa é o aumento do banho de sangue de soldados de ambos os lados e da população civil ucraniana, o aumento de refugiados e a destruição da infraestrutura da Ucrânia pelos bombardeios russos. A celebração da paz na Ucrânia não produziu avanços porque quem deveria negociá-la seriam os governos dos Estados Unidos e da Rússia porque só estes governos teriam capacidade de eliminar as causas da guerra. No entanto, irresponsavelmente, o governo dos Estados Unidos nada faz para negociar a paz com o governo da Rússia e, ao invés disto, arma os ucranianos e impõe sanções econômicas e financeiras contra o governo russo e seus cidadãos fazendo com que a guerra entre a Rússia e a Ucrânia possa evoluir para um conflito que se estenderia pela Europa e pelo mundo se transformando na 3ª Guerra Mundial.
Muito dificilmente o governo dos Estados Unidos com seu complexo industrial-militar trabalhará na construção da paz no conflito entre Rússia e Ucrânia. Com 102 guerras em seu "currículo" belicoso, os Estados Unidos são, provavelmente, um dos países mais envolvidos em ações militares do mundo que começou com a anexação de terras do México a seu território e a conquista do canal do Panamá. Não é coincidência que os Estados Unidos sejam um dos países que mais se beneficiam economicamente de confrontos armados, já que as maiores exportadoras de armas do mundo são norte-americanas. Para além da venda de munição e armas, os Estados Unidos monetiza, também, com contratos de segurança e treinamento militar, o que faz com que muitos membros do Congresso estadunidense entendam as guerras como uma máquina geradora de emprego e dinheiro. A paz, para os Estados Unidos, poderia lhe custar muito caro. São esses fatos que levam muitos a questionarem a real motivação dos Estados Unidos na defesa da Ucrânia, que há anos vive em estado de tensão com a Rússia. Fica evidente que, enquanto houver indústria bélica no mundo, as guerras continuarão a proliferar em todo o planeta. A paz no mundo só acontecerá quando houver o desarmamento de todos os países e a cessação da fabricação de armas.
Pelo exposto, pode-se afirmar que as grandes potências capitalistas, dispondo de indústrias bélicas, patrocinam a corrida armamentista e a manutenção de exércitos permanentemente organizados divorciados da sociedade civil e ao mesmo tempo levando à subversão radical da economia e da sociedade. O grande complexo militar-industrial desvinculado da sociedade civil exige a proliferação de guerras e a adoção de uma permanente economia de guerra. Esta nova economia da morte estendeu-se como uma mortalha sobre as estruturas das sociedades na era contemporânea, sobretudo nos Estados Unidos. A moderna democracia do Ocidente é incapaz de ocultar o fato de que ela é governada pelo monstro representado pelo aparato que administra e disciplina de forma continuada o cidadão aparentemente livre do Estado em nome da economia monetária total e da economia de guerra a ela vinculada até hoje, sobretudo nas grandes potências capitalistas. Em nenhuma sociedade ao longo da história houve tão grande participação de funcionários públicos e administradores, soldados e policiais e nenhuma delas jamais utilizou uma parcela tão grande de seus recursos em armamentos e exército como na atualidade.
Um fato é evidente: a paz jamais será construída no mundo com a existência do complexo industrial-militar e da economia de guerra, sobretudo nas grandes potências capitalistas. É por isto que se torna um imperativo o fim do complexo industrial-militar e da economia de guerra no mundo. Isto significa dizer que, para existir a paz no mundo, é preciso que haja o fim do complexo industrial-militar e da economia de guerra. Para existir a paz no mundo, é preciso haver o desarmamento mundial. Para existir a paz no mundo, os detentores do poder político e econômico nas grandes potências capitalistas aceitariam o desarmamento global? Os dirigentes e o lobby da indústria bélica aceitariam o fim da economia de guerra? O não é a resposta para estas duas questões. Isto significa dizer que a humanidade está diante de um impasse de difícil superação que é a de desarmar os belicistas e levar ao fim a economia de guerra para fazer prevalecer a paz mundial.
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* Fernando Alcoforado, 83, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, da SBPC- Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e do IPB- Instituto Politécnico da Bahia, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário (Engenharia, Economia e Administração) e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, foi Assessor do Vice-Presidente de Engenharia e Tecnologia da LIGHT S.A. Electric power distribution company do Rio de Janeiro, Coordenador de Planejamento Estratégico do CEPED- Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Bahia, Subsecretário de Energia do Estado da Bahia, Secretário do Planejamento de Salvador, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.
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