Para melhor compreender o conflito entre judeus e palestinos convém conhecer sua história a partir do II milênio a. C. Entre os antigos povos da Palestina, os Filisteus foram os que maior influência exerceram até aos últimos séculos da era pré-cristã. Não foi por acaso que foi dado o nome de Palestina a toda a região, isto é, o país dos Filisteus. Os vários reinos palestinos, filisteus e de Israel, coexistiram durante séculos na região. Em alguns momentos guerrearam entre si, em outros momentos se aliaram para combater o jugo de alguma grande potência da época. Os judeus se defrontaram na sua história com várias diásporas que dizem respeito a diversas expulsões forçadas pelo mundo e consequente formação das comunidades judaicas fora do que hoje é conhecido como Israel. De modo geral, se atribui o início da primeira diáspora judaica ao ano de 586 a.C., quando Nabucodonosor II, imperador da Babilônia (situada na antiga Mesopotâmia, situada a cerca de 85 km ao sul de Bagdá no Iraque), invadiu o Reino de Judá, destruindo Jerusalém e o Templo Judáico, além de deportar os judeus para a Mesopotâmia.
No século I, os romanos invadem a Palestina e destroem o templo de Jerusalém. No século seguinte, destroem a cidade de Jerusalém, provocando a segunda diáspora judaica fazendo os judeus irem para outros países da Ásia Menor, África e sul da Europa. Com o domínio do Império Romano sobre a Judeia, a maior parte dos judeus que lá viviam emigrou para a Babilônia, que se tornou o maior centro comunitário judaico no mundo até o século XI. Com o triunfo das ideologias nacionalistas na Europa e da ideia de criação do estado nacional, surgiu no século XIX entre os judeus da Europa central e oriental um movimento nacionalista cujo objetivo era a criação de um estado dos judeus, sendo este considerado como o único meio de assegurar a identidade e a sobrevivência da nação judaica, assim como de lhe garantir um lugar ao sol entre as demais nações. O nacionalismo judaico tomou o nome de sionismo, palavra que deriva de Sião, um dos nomes de Jerusalém na Bíblia. Inicialmente de caráter religioso, o sionismo pregava a volta dos judeus à “Terra de Israel”.
O sionismo, um movimento nacionalista judeu que se consolidou na década de 1890, surgiu em 1896 depois da publicação de um livro por um jornalista judeu húngaro chamado Theodor Herzl. O livro, chamado O Estado Judeu, sugeria a criação de um Estado Nacional para abrigar os judeus da Europa. Esse movimento é entendido como um movimento nacionalista que se estabeleceu como uma resposta judaica ao crescimento do antissemitismo que afetava judeus de todas as partes da Europa, sobretudo na Europa Central e Oriental. A resposta judaica a isso foi defender a criação de um Estado judaico, e o local escolhido foi a Palestina, região que foi habitada pelos judeus na Antiguidade, mas que tinha sido abandonada por eles na Diáspora em consequência da perseguição que sofriam dos romanos. A grande questão é que a região era habitada pelos árabes palestinos havia muitos séculos. Para garantir a formação de um Estado judaico naquela região, foi formada a Organização Sionista Mundial, que passou a atuar na compra de terras na Palestina para arrendá-la aos judeus.
A Primeira Guerra Mundial teve consequências trágicas para a Palestina com a derrota do Império Otomano (Turquia atual), aliado da Alemanha derrotada na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), que exercia a dominação sobre a Palestina. Após o conflito mundial, foi criado, pelo artigo 22 do Pacto da Liga das Nações a 28 de Junho de 1919, o sistema dos Mandatos que se destinava a determinar o estatuto das colônias e dos territórios que se encontravam sob o domínio das nações vencidas. O Mandato Britânico que incluía a Palestina foi aprovado pelo Conselho da Liga das Nações a 24 de Julho de 1922. O Mandato britânico para a Palestina deixou de considerar como objetivo levar à plena independência a população que então a habitava, isto é, a população palestina. Ao invés disso, promoveu a criação de um lar nacional judaico, isto é, a criação de um estado judaico com gente que, na sua maioria esmagadora, estava espalhada pelo mundo e, por conseguinte, deveria ser trazida de fora. A Grã-Bretanha, potência hegemônica na época, prometeu à Federação Sionista que faria todo o possível para o estabelecimento de "um lar nacional para o povo judaico" na Palestina com a chamada Declaração Balfour.
Os palestinos viram no patrocínio que deram, primeiro a Grã-Bretanha e depois a Liga das Nações, ao projeto sionista de criação do lar nacional judaico na Palestina a negação do seu direito à independência. Os palestinos se sentiram espoliados. Naturalmente, os palestinos se opuseram ao projeto da criação do lar nacional judaico na Palestina desde o primeiro instante logo que tiveram conhecimento da Declaração Balfour e tentaram, por todos os meios, impedir a sua realização, pois temiam que dela resultasse a sua submissão, não só política, mas também, econômica aos judeus, passando assim do domínio do Império Otomano para o domínio judaico, com um intervalo de dominação britânica. Os palestinos apresentaram protestos contra a Declaração Balfour à Conferência de Paz de Paris e ao Governo Britânico. A primeira manifestação popular contra o projeto sionista teve lugar a 2 de Novembro de 1918, primeiro aniversário da Declaração Balfour. Essa manifestação foi pacífica, mas a resistência palestina logo se tornou violenta, expressando-se em ataques contra os judeus que degeneravam em confrontos sangrentos a partir deste momento.
A criação do moderno Estado de Israel em 1948 foi o resultado do contexto de perseguição que os judeus viveram na Europa por causa dos nazistas durante a 2ª Guerra Mundial. As condições políticas permitiram a criação do Estado de Israel. Após a 2ª Guerra Mundial, a criação do lar nacional judeu passou a ser vista pela opinião pública como uma forma de reparação pelo Holocausto nazista. Na sessão de 29 de Novembro de 1947 da Assembleia Geral da ONU presidida pelo brasileiro Oswaldo Aranha, a maioria dos países membros votaram a favor do Plano de Partilha da Palestina. Os países árabes se opuseram abertamente à proposta e não reconheceram o novo Estado de Israel. Sem resolver o impasse entre judeus e palestinos, foi criado o Estado de Israel por imposição dos governos dos Estados Unidos e do Reino Unido em detrimento dos palestinos que não foram contemplados, também, com a criação do Estado da Palestina.
Um fato é evidente: a história de Israel tem girado em torno de conflitos com palestinos e nações árabes vizinhas que vêm sendo sacudidos por guerras e confrontos entre judeus e árabes que não concordam com a divisão territorial das antigas terras palestinas. De 1948 em diante uma série de conflitos aconteceram na região como fruto dessa disputa pelo território entre judeus e árabes. O primeiro conflito foi a Primeira Guerra Árabe-Israelense, de 1948, em que diferentes nações árabes se uniram contra o recém-fundado Estado de Israel. Esse conflito teve duração de 1948 a 1949, se encerrando com a vitória israelense e a ampliação de seu território. Em 1967, Israel ocupou a península do Sinai, a Cisjordânia, a faixa de Gaza, as Colinas de Golã e o sul do Líbano depois da Guerra dos Seis Dias contra o Egito, a Síria e a Jordânia. A Península do Sinai foi devolvida ao Egito somente em 1982, e as colinas de Golã até hoje não foram devolvidas à Síria pelo governo de Israel. A ocupação israelense na região após a Guerra dos Seis Dias é considerada ilegal pela comunidade internacional e pela Organização das Nações Unidas.
É importante observar que, para o Sionismo, o Estado de Israel não é um fim, mas um meio para alcançar os seus objetivos. Ben Gurion, judeu polonês, primeiro chefe de governo de Israel de 1948 a 1963, afirmou que "após nos tornarmos uma força poderosa, como resultado da criação do estado, nós aboliremos a partilha e nos expandiremos para toda a Palestina. (...) O estado será apenas um estágio na realização do sionismo e sua tarefa é preparar a base para nossa expansão por toda a Palestina". Para manter sua dominação, os sionistas necessitam de um poderoso sistema de dominação militar sobre a maioria palestina muçulmana, cristã e laica. O Estado de Israel é o único país do Oriente Médio a ter armamentos nucleares e recebe anualmente dos Estados Unidos, além de apoio e proteção militar, bilhões de dólares. Israel armou seu exército com armas atômicas e vem massacrando civis palestinos que habitam a Cisjordânia e a Faixa de Gaza com armamentos ultra-avançados. Além disso, Israel usurpou, ocupou e construiu prédios em terras que não pertenciam a israelenses e tinham proprietários palestinos regulares e legais. Isto explica o comportamento dos atuais governantes de Israel que não aceitam a existência de um Estado da Palestina na região.
Muitos observadores internacionais apontam que os palestinos são mantidos em um regime de apartheid por Israel. As condições de vida impostas aos palestinos na Faixa de Gaza são cada vez piores, e bombardeios israelenses na região têm sido comuns. Isto além da dificuldade de acesso ao básico na região, como alimento, remédios, energia elétrica e água potável. No caso da Cisjordânia, debate-se a progressiva ocupação do território por israelenses. Nas últimas décadas, o território palestino tem sido ocupado por assentamentos israelenses que forçam a migração da população palestina, se tornando alvo da violência cometida por forças militares israelenses. Existem denúncias de pogroms contra palestinos, e muitos relatórios internacionais apontam que eles são tratados como cidadãos de “segunda categoria”, sendo abertamente discriminados. As prisões israelenses estão abarrotadas de palestinos que reagem contra a tirania imposta pelo governo israelense ao povo palestino.
A carnificina que se vê hoje na Faixa de Gaza, nada tem de novidade, porque ela já ocorreu inúmeras vezes no passado em toda a Palestina, embora, desta vez, o horror dos crimes do governo de Israel contra a humanidade alcance novos e vergonhosos recordes. Um total de mais de 28.700 palestinos foram mortos e quase 69.000 outros foram feridos na guerra israelense na Faixa de Gaza desde 7 de outubro de 2023. Atualmente, cerca de 1,9 milhão de palestinos estão desabrigados como resultado da guerra que começou em 7 de outubro de 2023. Este número é equivalente a mais de 80% da população total da Faixa de Gaza que foram deslocadas desde o início da guerra entre o governo de Israel e o Hamas, segundo informou a Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA). Com mais esse assassinato em massa de palestinos, Israel se afasta cada vez mais da possibilidade de ser aceita como Estado regular, permanente, nessa região porque para integrar-se e sobreviver, Israel depende de ser aceita pelos povos que vivem na Palestina e no mundo árabe.
Sob o argumento de tentar aniquilar o Hamas em resposta à ação terrorista de 7 de outubro de 2023, o sionismo, que está no poder em Israel sob o comando de Benjamin Netanyahu, pratica um inominável crime de guerra contra o povo palestino com a política de bombardeio contínuo e covarde dos seus centros urbanos e de isolamento desta população em Gaza que funciona como um gueto similar, por exemplo, ao Gueto de Varsóvia na Polônia implantado pela Alemanha nazista contra os judeus. É pouco provável que o conflito entre palestinos e judeus seja solucionado na atualidade devido aos sionistas que comandam o Estado de Israel e as várias correntes extremistas palestinas e, também, porque as instituições internacionais existentes não são capazes de construir uma saída negociada para o conflito entre o Estado de Israel, o povo palestino e os países árabes. Os Estados Unidos perderam a capacidade de mediar qualquer conflito, nenhuma outra grande potência reúne condições para exercer este papel e a ONU é incapaz de promover a paz nas dimensões local, regional ou global na atualidade. É importante observar que a prática sionista do Estado de Israel contribui decisivamente para que, não apenas seja inviabilizada a paz na região, mas também seja ampliado o antissemitismo que avança entre os povos árabes e em todo o mundo.
É oportuno observar que, segundo o general alemão Carl Von Clausewitz, autor da famosa obra Da Guerra- a arte da estratégia (Tahyu, 2005), o objetivo da guerra é aniquilar o inimigo. Entretanto, segundo Sun Tzu, general, estrategista e filósofo chinês, autor da famosa obra Arte da Guerra (L&PM, 2000), o verdadeiro objetivo da guerra é a paz e a suprema arte da guerra é derrotar o inimigo sem lutar. Enquanto Clausewitz preconiza o uso da força militar para aniquilar o inimigo, Sun Tzu propõe construir a paz e derrotar o inimigo sem lutar. A tese de Clausewitz não se aplica ao conflito Israel - Palestina porque nem Israel pode aniquilar os palestinos, nem vice-versa. Nem os sionistas nem os grupos extremistas palestinos terão condições de impor suas vontades pela força das armas na Palestina. Só há uma solução para o conflito na região: a construção da paz, como preconiza Sun Tzu, cuja iniciativa deveria partir de Israel que só poderá acontecer se o povo judeu em Israel e no mundo inteiro repelir politicamente os setores sionistas, belicistas e fascistas, que exercem o poder no país e constituir um governo que busque a conciliação com o povo palestino.
A continuidade do conflito Israel- Palestina tende a produzir também uma guerra regional envolvendo todos os países da região. A passagem de uma guerra regional para um conflito global pode também acontecer com o envolvimento das grandes potências militares (Estados Unidos, Rússia e China) na defesa de seus interesses e de seus aliados na região. Precisamos evitar que o conflito Israel- Palestina se transforme no epicentro de uma nova Guerra Mundial. Só a paz entre palestinos e judeus, evitará o pior para a humanidade.
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