Pirajá.

Grande parte das pessoas que viveram comigo já faleceram, parentes, amigos de várias épocas, vizinhos na velha Bahia ou fora dela e do Brasil. Sou um inveterado leitor de livros e documentos, fico feliz ao escrever. Gosto de escrever a mão ou na Olivetti peça de Museu. ESCREVER.  

O Mestre José Martins Catharino era da idade de meu pai. Ambos andavam de linho branco, como quase todos, ambos jogavam tênis, ambos grandes professores e escritores. Certa feita Zezé Catharino me chama ao escritório dele na Cidade Baixa. E lá fui. José Mário, estou a chegar da Espanha e fiquei hospedado com Yoyo (para os parentes e velhos amigos). Conversamos muito. Você quer ficar no meu lugar na Diretoria da Companhia Progresso e União Fabril da Bahia? Não tenho tempo. DUAS Faculdades, o escritório sempre cheio, os livros que escrevo, conferências, viagens em Congressos... 

Estou às ordens, Zezé, como o chamava. Chega um empresário do comércio com hora marcada. Marcou o dia e hora para me levar e apresentar a Diretoria.  O Presidente, o irmão Alberto Martins Catharino, o Superintendente Luiz Martins Catharino Gordilho, Carlos Catharino já idoso, tio, mais outros como o Dr. Délio casado com uma Catharino. Edifício União na Cidade Baixa.  

No dia Zezé entra comigo e na reunião da Diretoria me apresenta como o Advogado que iria ficar no seu lugar por falta de tempo. Deram-me uma carteira ao do Engenheiro Aquilino, filho de espanhóis. O 4* andar todo era a Companhia Progresso. E logo entregaram-me 1.500 casas, fora os terrenos, inclusive a Ilhota do Cabrito, perto de Plataforma, onde o Comendador Bernardo Martins Catharino teve uma fábrica de tecidos no século XIX. Levei 12 anos. 

O mais jovem no meio de homens bem mais velhos e ricos. 12 anos de meu sucesso como representante do Mestre José Martins Catharino, que me viu nascer e fui seu aluno. Luiz Martins Catharino Gordilho me chama no gabinete dele, chama o Engenheiro Aquilino. "Estão invadindo as terras de Pirajá da Companhia Progresso. Vocês terão que agir. Pirajá conhecia da História do 2 de Julho que Cid Teixeira chamava como Castro Alves dizia "Os cerros da Bahia". O historiador Gabriel Soares descreve o local onde havia muitos engenhos de açúcar como o de Diogo da Rocha de Sá com a capela de São Sebastião, o de João de Barros Cardoso com a Igreja de Nossa Senhora da Encarnação, vários outros em ruínas, inclusive local de muita água como a cachoeira de São Bartolomeu. 

Pois ali Aquilino e eu constatamos que eram as terras da Companhia Progresso. Uma invasão até de matadouro. Era a própria confusão, pois a Prefeitura Municipal de Salvador desapropriou o local. Foi um enorme trabalho para saber o que era de quem. Dezenas de vezes naquela região, Aquilino levantou toda a área e fez uma planta que Luiz Gordilho levou à Prefeitura. 

Para salvar alguma terra do passado fui autorizado e retomar judicialmente  a "Ilhota do Cabrito" com a inicial medida Ad Perpetuam Rei Memoriam, uma vistoria, como prova para a Ação de Reintegração de Posse. Tinha que comunicar a Zezé Catharino algo tão complicado. Ele me disse assim: "O que você fizer eu aprovo". A vistoria foi feita na 1* Vara Cível, cujo Juiz de Direito o saudoso amigo Abreu Filho. 

Na primeira audiência fizemos um acordo com a família da Ilhota do Cabrito em dinheiro. A Companhia Progresso pagou e deu-se a Reintegração de Posse. Nas terras perto de Pirajá. Pois como a situação das terras no Brasil vem desde as sesmarias, em 24 de setembro de 1857 o Coronel José Vicente do Amorim  Bezerra, egresso das lutas pela Independência, foi visitar Pirajá saindo do engenho Plataforma, então de Bartazar de Araújo de Aragão Bulcão e no altar de São Bartolomeu, Frei Carneiro da Cunha houve uma missa pelo sufrágio dos mortos da batalha de Pirajá. 

Ali fundou-se a "Sociedade Pirajá" com Baltazar Bulcão na Presidência e mais José Vicente Amorim Bezerra, João Gualberto dos Passos, Agrário de Souza Menezes, José Marcelino dos Santos, José Ferreira de Barros, e Luís Álvares dos Santos, informa o grande gênio da História Cid Teixeira, amicíssimo nosso. Toda está região ou quase toda foi também da Companhia Progresso, cujo Diretor (representando Mestre Zezé Catharino) e Advogado por 12 anos quase 13 era eu.

Que trabalho gigantesco para resolver muitos problemas de terras abraçando a todos com paciência e respeito. Quando sair da Companhia Progresso para fazer concurso para a Magistratura, essa empresa deu-me um documento exaltando minha honestidade, competência e seriedade que é uma beleza. Esse documento é assinado por Alberto Martins Catharino, Presidente e Luiz Martins Catharino Gordilho, Superintendente. 

Encontra-se no TJBA uma cópia desde minha posse como concursado JUIZ DE DIREITO. Antes ficasse lá que estaria muito melhor como Advogado do que, hoje, aposentado do TJBA. 

Mudando de assunto: como estará hoje em dia Pirajá?!  Naquela época já havia invasão... terra neste País tem dono! Quem? Quem?