O acesso à saúde para pessoas trans é um direito fundamental reforçado por iniciativas que buscam garantir um atendimento mais inclusivo e qualificado. Para isso, a Secretaria de Estado da Saúde (SES), por meio da Fundação Estadual da Saúde (Funesa) e da Escola de Saúde Pública de Sergipe (ESP/SE), tem promovido capacitações voltadas aos profissionais de saúde, direcionadas aos que atuam nos hospitais e centros de especialidades do Sistema Único de Saúde (SUS).
As capacitações têm como foco a qualificação do atendimento e da assistência prestada à população LGBTQIAPN+, destacando a importância de um acolhimento humanizado e especializado. Além disso, reforçam a relevância do ambulatório multidisciplinar específico para atender a população trans, localizado no Hospital Universitário de Lagarto, como um espaço de referência no estado. O serviço oferece atendimento em endocrinologia, psicologia, serviço social, farmácia, fonoaudiologia, psiquiatria, ginecologia e urologia, incluindo consultas, acompanhamento pré e pós-cirúrgico e hormonioterapia.
A assessora parlamentar e bacharela em Serviço Social, Ariel Matos, é atendida pelo ambulatório há cerca de seis anos. Ela destaca a importância da capacitação dos profissionais de saúde e da ampliação da compreensão das identidades de gênero, especialmente entre pessoas cisgêneras - aquelas que se identificam com o gênero designado ao nascer com base em características biológicas.
“A inclusão dessa população na política de saúde reforça a necessidade de mais investimentos para ampliar esses serviços, além de estimular, valorizar e capacitar os trabalhadores da saúde. O alto índice de mortalidade da população trans e travesti revela que outros direitos foram negados antes que a violência mais brutal se concretizasse, como a violação do direito à saúde por meio do desrespeito ao nome e ao pronome, da discriminação, da recusa no atendimento e até do constrangimento de pessoas trans e travestis. A formação continuada e as capacitações são instrumentos essenciais para romper preconceitos e estimular a reflexão”, afirmou Ariel.
A artista e profissional de vendas e marketing Nathalia Barcelox também é usuária do ambulatório de Lagarto e, há cerca de um ano, vem sendo acompanhada por uma equipe multidisciplinar em seu processo de transição de gênero. “Quando iniciei meu acompanhamento hormonal, recebi todo o suporte da assistência social, que mantenho até hoje. Primeiro conheci o ambulatório para entender o funcionamento e fui acolhida pela equipe. A partir daí, passei a ter acompanhamento com profissionais que esclarecem dúvidas sobre os medicamentos e seus possíveis efeitos”, explicou.
Nathalia acredita que a capacitação dos profissionais da saúde é essencial para garantir um atendimento digno e igualitário à comunidade LGBTQIAPN+. “Acredito que isso enriquece tanto os profissionais quanto os usuários. O profissional passa a conhecer outra cultura. E ao ter contato com pessoas LGBTQIAPN+, principalmente com a comunidade trans, ele começa a entender que o mundo vai além daquela bolha em que só existem homens e mulheres cis. Existem outros corpos que frequentam aquele espaço, que precisam de cuidados, acompanhamento, e acima de tudo, ter qualidade de vida”, ressaltou.
Capacitação para profissionais de saúde
Ao trazer o atendimento qualificado à comunidade LGBTQIAPN+ como tema central do debate, iniciativas como o curso de capacitação realizado em 2024 buscam desconstruir padrões e construir uma abordagem mais acolhedora.
A psicóloga Lidiane Drapala, que foi uma das palestrantes do evento, enfatiza a importância da capacitação continuada para os profissionais de saúde, com foco na humanização para a população LGBTQIAPN+, que frequentemente enfrenta negligência, violações e invisibilização. Segundo ela, o desenvolvimento de tecnologias e técnicas que aproximem profissionais e usuários(as) é essencial.
“Se não tivermos sensibilidade suficiente para entender a dimensão dessas questões, qualquer orientação técnica perde o sentido. Quando falamos de pessoas LGBTQIAPN+, que sofrem violência e muitas vezes não têm o direito de ser quem são, precisamos redobrar essa sensibilidade. É essencial ter paciência com as dores do outro e humildade para compreender sua história”, destacou a psicóloga.
Lidiane Drapala também ressalta que a transição de gênero pode estar associada a transtornos de ansiedade e estresse pós-traumático, agravados pela dificuldade de viver a própria identidade em uma sociedade ainda marcada pelo preconceito. “Essas vivências trans também são permeadas pelo medo da falta de empregabilidade, da rejeição familiar e até da insegurança no direito de ir e vir. Precisamos desenvolver estratégias para reduzir esse sofrimento e enfrentar essa realidade”, concluiu.
Já a enfermeira do ambulatório do Hospital Universitário de Lagarto, Amanda Vitório, destaca a importância do acompanhamento por uma equipe multidisciplinar para garantir o acesso à saúde integral das pessoas trans usuárias do serviço. Segundo ela, a capacitação dos profissionais é essencial para fortalecer um atendimento humanizado e com equidade.
“Isso reduz o preconceito e a discriminação, além de proporcionar um acolhimento mais individualizado e equitativo, de acordo com as necessidades de cada pessoa. No ambulatório, essas pessoas são chamadas pelo nome social, sendo que um dos seus maiores receios é justamente não serem reconhecidas dessa forma. Com o tempo, percebem que estão em um ambiente seguro, humanizado e livre de discriminação, onde se sentem bem, confortáveis e devidamente cuidadas”, enfatizou Amanda.
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