Azeite, algodão, canola, girassol, coco, palma, dendê, linhaça, amendoim e vários outros óleos vegetais comestíveis foram retirados pelos deputados da lista de produtos que compõem a cesta básica, que ficou restrita à soja e milho.
Representantes setoriais e líderes da agricultura reivindicam ao Senado a reversão da retirada de praticamente todos os óleos vegetais comestíveis da lista de produtos que comporão a cesta básica. O texto do PLP 68/2024, que trata da regulamentação da Reforma Tributária, aprovado pela Câmara dos Deputados delimitou o benefício da alíquota zero apenas à soja, babaçu e milho.
“O Projeto de Lei enviado pelo Executivo trazia o termo ‘óleos vegetais comestíveis’, o que abrangia todos os óleos e permitia ao consumidor ter liberdade de escolha no produto de acordo com a sua preferência e cultura regional”, explicou o presidente do Sindicato da Indústria da Extração de Óleos Vegetais e Animais e de Produtos de Cacau e Balas no Estado da Bahia (Sincaol), Hilton Lima. “Quando foi aprovado na Câmara, mudaram o texto e deixaram apenas ‘soja’, ‘milho’ e ‘babaçu’, isso causou estranheza em todo o mercado, pois babaçu é um cosmético e a soja é quase toda destinada para a produção de combustível. O consumidor ficará restrito há apenas duas opções, sendo que o Brasil é produtor de inúmeros tipos de óleos comestíveis com benefícios muito maiores. Cabe ainda destacar que a mudança que estamos reivindicando não vai alterar a alíquota final, porque o consumidor vai escolher um tipo de óleo comestível”, completou.
De acordo com o economista da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB), Ricardo Kawabe, a decisão dos deputados criará uma distorção no mercado de óleos vegetais, não apenas elevando drasticamente o preço ao consumidor de quase todos os óleos como na indústria alimentícia como um todo. “Podemos dar o exemplo do óleo de algodão. Ele é produzido aqui na Bahia com ampla utilização na indústria alimentícia. Com o aumento do preço, o impacto vai ser sentido em todos os alimentos que utilizam ele como ingrediente. Isso vale para os demais óleos”, explicou. Caso prevaleça a restrição, poderá haver inclusive um aumento no preço do próprio óleo de soja pela maior procura devido ao preço mais competitivo, o que vai impactar inclusive no preço do biodiesel”, concluiu.
A tributarista Rosany Nunes de Mello destaca que a decisão vai de encontro com a estratégia legislativa de impulsionar o estabelecimento de alíquotas mais favoráveis do IBS e da CBS para os alimentos integrantes da Cesta Básica Nacional no incentivo à alimentação saudável para o povo brasileiro e na promoção da justiça social. “Além da soja ser hoje a cultura notoriamente mais beneficiada com isenções tributárias, até mesmo como uma política de incentivo à produção de biocombustíveis, agora ela será soberana sobre todas as demais culturas de óleos vegetais comestíveis, o que é extremamente controverso pois ela está longe de ser o alimento mais saudável”, completou.
Três emendas solicitando o retorno do termo original “óleos vegetais comestíveis”, conforme determinado pela Secretaria de Receita, foram apresentadas pelos senadores Luis Carlos Heinze (PP/RS), Mecias de Jesus (Republicanos/RR) e Zequinha Marinho (Podemos/PA).
Privilégio.
Estudo elaborado em outubro de 2023 em parceria pela ACT Promoção da Saúde, Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) que mapeou e calculou que, no nível federal, a renúncia fiscal estimada para produção da soja no Brasil foi de R$57 bilhões em 2022, o dobro da desoneração prevista para todos os produtos da cesta básica. “Analisando a renúncia fiscal no âmbito dos estados, a desoneração do ICMS da soja é de quase R$8 bilhões por ano apenas em Mato Grosso. É seguro supor que outros estados produtores têm níveis de desoneração semelhantes, o que permite estimar que a desoneração dos estados pode chegar perto de R$ 25 bilhões, uma vez que Mato Grosso responde por 1/3 da produção nacional”, destaca o relatório.
O estudo argumenta que a cadeia da soja é o exemplo de uma longa trajetória de ciclos econômicos com grande concentração de renda, enorme impacto ambiental e injustificáveis privilégios. Historicamente, a política tributária, somada a outras políticas públicas, privilegiou a produção do grão em detrimento de outras alternativas necessárias à segurança alimentar da população brasileira, acarretando bilionárias renúncias fiscais e enormes custos ambientais.
Para as organizações envolvidas no levantamento, o Estado brasileiro já cumpriu seu papel em apoiar a estruturação do setor da soja e, com a reforma tributária, tem a oportunidade de repensar prioridades, considerando o enfrentamento à fome com alimentos saudáveis e produzidos de modo sustentável, bem como a necessidade de diversos outros investimentos possíveis a partir destes recursos públicos atualmente destinados ao setor produtivo da soja.
VANESSA RONQUIM MARTINS / CONSULTORA DE COMUNICAÇÃO SÊNIOR